segunda-feira, 17 de janeiro de 2011

O Amigo e a Ex-Namorada

Todos os meus amigos próximos têm conhecimento, há vários anos, da minha orientação sexual e todos receberam a informação com alguma surpresa mas com o maior respeito e apoio. Fico até feliz por dizer que a minha amizade com cada um deles continua ainda hoje a evoluir no sentido de um maior companheirismo, proximidade e bom ambiente. Não sei se fui eu que tive sorte mas, a verdade é que me orgulho de ter o melhor grupo de amigos do mundo e posso dizer que são MUITOS e BONS.
Havia no entanto, duas pessoas do meu círculo próximo com quem tinha bastante receio de abordar o tema. Durante a minha adolescência tive várias namoradas e relações passageiras mas a L foi a primeira pessoa por quem me apaixonei verdadeiramente e namoramos durante 2 anos, entre os meus 17 e os meus 19 anos. E, ao contrário de todas as outras é alguém por quem nutro muita amizade e com quem ainda me encontro frequentemente. A outra pessoa é o N, o meu melhor amigo na altura do secundário. A verdade é que já tive para ter esta conversa com eles várias vezes porque são pessoas importantes na vida com quem gostaria de partilhar a minha sinceridade e aquilo que me faz feliz mas, tinha vários receios…
Conheci o N no secundário e rapidamente nos tornamos amigos. Chegamos mesmo a reprovar no mesmo ano e como também tínhamos matemática em atraso acabávamos sempre por ser os únicos da turma a ter de ficar na escola de tarde para ter a disciplina com uma turma do ano anterior. Éramos compinchas de brincadeiras e de saídas, colegas de carteira, sócios de falcatruas nos testes e fazíamos as aulas de educação física juntos até porque éramos quase os únicos rapazes. Ouvia por vezes as suas piadas relativamente ao tema da homossexualidade mas no fundo sabia que era mais uma questão do machismo típico da adolescência do que homofobia propriamente dita. No 12º ano, a L entrou na nossa turma, aproximamo-nos e pouco tempo depois estávamos a namorar. Alguns meses depois o N começou também uma relação com uma amiga nossa, a S. Relação essa que dura até aos dias de hoje para muita felicidade minha.
Eramos os Fantastic Four, fazíamos programas de fim-de-semana em conjunto, cinemas e mesmo férias de Verão e dávamo-nos todos extremamente bem sendo constantemente acompanhados por uma aura de boa disposição. Até que decidi terminar com a L, altura em que deixamos de estar todos juntos com tanta frequência até porque fomos todos para faculdades diferentes.
Recentemente a L, sabia que eu estava numa relação já há bastante tempo e quase sempre que nos encontrávamos mostrava interesse em saber quem era a pessoa. De minha parte, a verdade é que sabia que tinham sido dois anos importantes na nossa vida, sabia que ela tinha perdido a virgindade comigo e que isso é importante para uma rapariga. Como tal, tinha medo que de algum modo esta minha faceta, aos olhos dela, viesse a por em causa aquilo que eu sentia por ela na altura ou mesmo que desmoronasse as memorias que tinha de mim. Quando lhe contei ficou extremamente surpreendida, como era de esperar, mas não me pareceu de todo magoada. Falamos durante horas e ela apenas recriminou o facto de eu nunca lhe ter falado no assunto após tantos anos e fez imensas perguntas. Algumas delas francamente descabida para quem é licenciada numa área de saúde como por exemplo. “Mas… tens doenças?” ao que lhe respondi um indignado “Desculpa?? Não estou a ver o que é que uma coisa tem a ver com a outra!!!” . No fim marcamos encontrar-nos novamente no fim-de-semana juntamente com o N e a S.
Sempre admirei muito a S, é actualmente uma enfermeira e uma mulher extremamente inteligente e perspicaz e já em conversa lhe tinha dado umas dicas o que foi o suficiente para ela ter captado a informação já há alguns anos atrás. Contudo, nunca tínhamos falado directamente nisso. Deste modo, quando nesse fim-de-semana abri o jogo eles referiram que já tinham comentado sobre o assunto. Por seu lado, o N, admitiu que até aquele momento tinha estado numa argumentação interior em que um lado lhe dizia “Ele pode ser, isso justifica nós ainda não conhecermos a pessoa com quem ele namora” enquanto outro lado lhe dizia “Não é possível, não pode ser, já o conheço há tantos anos, sempre falamos de raparigas”. Admitiu também que compreendia o porque de nunca lhe ter falado no assunto e que provavelmente só mais recentemente é que construiu maturidade suficiente para encarar o tema com naturalidade.
De minha parte, foi um peso que me saiu de cima. Estava francamente cansado de desviar o assunto e de esconder uma parte importante da minha vida a três pessoas que fazem parte da minha história de uma maneira tão marcante. No fundo, a verdade, é que continuo a ser exactamente a mesma pessoa. Nem melhor nem pior e em nada influencia a minha personalidade ou me caracteriza. Não tenho mais receio…

8 comentários:

João Roque disse...

É muito bom o que contas.
Eu senti o mesmo, há uns anos atrás; assumido perante a família, tendo um relacionamento com uma pessoa com a qual compartilhava a casa, dos meus grandes amigos de infância sabia tudo de mim.
Quando comemorei 50 anos dei um grande jantar na Covilhã, onde estavam presentes todas as pessoas que foram importantes até essa data, na minha vida; estava a família mais chegada, o meu namorado e a sua família mais chegada e muitos amigos e amigas que foram de propósito lá a esse jantar, só homossexuais e lésbicas eram mais de uma dúzia, e estavam os meus amigos de infância, quase todos com as suas mulheres.
Fiquei surpreendido quando, após o jantar, e em amena cavaqueira com eles, me abri completamente acerca da minha homossexualidade e soube que todos eles sabiam disso há muito, mas nunca me tinham tratado de forma diferente.
Hoje, todos os meses, nos reunimos aqui em Lisboa, para uma almoçarada de convívio, vêm a minha casa, vou a casa deles (é de um deles a casa que mostrei em Azenhas do Mar) e até já conhecem o Déjan
Nada é mais importante do que sabermos que as pessoas de que gostamos, nos conhecem por inteiro.
Daí ter ficado satisfeito pelo peso que te saiu de cima.

Unknown disse...

Aplaudo-te a postura. Um dia sigo-te os passos. Mas ainda não me sinto preparado para receber tantos:

"Ohhhhhh vai-te fod**. Não és nada"

Theomentos disse...

Fico mtmtmtmt feliz por teres contado, por teres tirado esse peso das tuas costas e por estares feliz e por eles terem aceito na boa. Realmente poder contar para alguém é bom e melhor ainda se vier acompanhado de carinho e compreensão, sem revolta por parte deles, isso mostra o quão amigos são e é tão bom poder tê-los e contar com eles em todos os momentos :D Para mim foi um alívio quando contei a minha prima, logo minha tia já sabia e estava tudo bem para ela e asim foi com meu primo e meu tio, mais ainda quando soube que minha mãe já sabia porém não tinha comentado nada comigo, entendo que não deve ser nada fácil para ela já que devia ter tantos planos na cabeça sobre a nora e tal mas enfim agora ganhou um genro tão bom quanto :D

Teté disse...

Pois acho que a convivência com os amigos fica mais fácil se não existirem "segredos" desses pelo meio. Mas é óbvio que tem de se esperar o momento adequado, se o tema não surgir naturalmente...

Ainda bem que tudo se resolveu e que estás feliz! :)

Beijocas!

Rafeiro Perfumado disse...

Não posso imaginar o que é viver "escondido", mas posso bem imaginar a sensação de alívio que será poder assumir aquilo que se é.

Abraço!

Frankenstakion disse...

No more secrets!

paulo disse...

e ainda bem que assim é/foi: calmo e simples, natural, como deve ser!

Little Tiago Boy disse...

E quando contamos àqueles que nos são tudo, é uma sensação de alívio tão grande...